quarta-feira, 2 de junho de 2010
ASSIM FALOU JOÃO CALVINO POPULARIZANDO AS INSTITUTAS PARTE VI
PARA QUE ALGUÉM CHEGUE A DEUS O CRIADOR É NECESSÁRIO QUE A ESCRITURA SEJA SEU GUIA E MESTRA
. O VERDADEIRO CONHECIMENTO DE DEUS NA BÍBLIA
Portanto, ainda que esse fulgor, que aos olhos de todos se projeta no céu e na terra, mais que suficientemente despoje de todo fundamento a ingratidão dos homens, serve também para envolver o gênero humano na mesma incriminação. Deus a to- dos, sem exceção, exibe sua divina majestade debuxada nas criaturas, contudo é necessário adicionar outro e melhor recurso que nos dirija retamente ao próprio Criador do universo. Portanto, Deus não acrescenta em vão a luz de sua Palavra para que a salvação se fizesse conhecida. E considerou dignos deste privilégio aqueles a quem quis atrair para mais perto e mais íntimo.
Ora, visto que ele via a mente de todos ser arrastada para cá e para lá em agita- ção errática e instável, depois que elegeu os judeus para si por povo peculiar, cer- cou-os de sebes, de todos os lados, para que não se extraviassem à maneira dos demais. Nem em vão nos retém ele, mediante o mesmo remédio, no puro conheci- mento de si mesmo; pois, de outra sorte, bem depressa se diluiriam até mesmo aqueles que, acima dos demais, parecem manter-se firmes. Exatamente como se dá com pessoas idosas, ou enfermas dos olhos, e tantos quantos sofram de visão emba- çada, se puseres diante delas mesmo um vistoso volume, ainda que reconheçam ser algo escrito, contudo mal poderão ajuntar duas palavras; ajudadas, porém, pela in- terposição de lentes, começarão a ler de forma distinta. Assim a Escritura, coletan-
do-nos na mente conhecimento de Deus que de outra sorte seria confuso, dissipada a escuridão, nos mostra em diáfana clareza o Deus verdadeiro.É esta, portanto, uma dádiva singular, quando, para instruir a Igreja, Deus não apenas se serve de mestres mudos, mas ainda abre seus sacrossantos lábios, não simplesmente para proclamar que se deve adorar a um Deus, mas ao mesmo tempo declara ser esse Aquele a quem se deve adorar; nem meramente ensina aos eleitos a atentarem para Deus, mas ainda se mostra como Aquele para quem devem atentar. Ele tem mantido esse proceder para com sua Igreja desde o princípio, para que, afora essas evidências comuns, também aplicasse a Palavra, a qual é a mais direta e segura marca para Reconhecê-lo.Não carece de dúvida que Adão, Noé, Abraão e os demais patriarcas tenham,mercê deste recurso, atingido íntimo conhecimento dele, o qual, de certo modo, os distinguia dos incrédulos. Não estou ainda falando da doutrina apropriada pela fé pela qual foram iluminados para a esperança da vida eterna. Ora, para que passas- sem da morte para a vida, foi-lhes necessário conhecer a Deus não apenas como Criador, mas ainda como Redentor, de sorte que chegaram seguramente a um e outro desses dois conceitos à base da Palavra.
Ora, na ordem, veio primeiro aquela modalidade de conhecimento mediante o qual fora dado alcançar quem é esse Deus por quem o mundo foi criado e é governa- do. Acrescentou-se depois a outra, interior, a única que vivifica as almas mortais, por meio da qual se conhece a Deus não apenas como Criador do universo e único Autor e Árbitro de todas as coisas que existem, mas ainda, na pessoa do Mediador, como Redentor. Entretanto, visto que ainda não chegamos à queda do mundo e à corrupção da natureza, deixo também de tratar de seu remédio.
Portanto, os leitores se lembrarão de que ainda não irei fazer considerações a respeito daquele pacto mediante o qual Deus adotou para si os filhos de Abraão, bem como daquela parte da doutrina por meio da qual os fiéis sempre foram devida- mente separados das pessoas profanas, pois que ele se fundamentou em Cristo, dou- trina essa que será abordada na seção cristológica, mas somente enfocarei como se deve aprender da Escritura que Deus, que é o Criador do mundo, se distingue, por marcas seguras, de toda a multidão forjada de deuses. Oportunamente, mais adiante, a própria seqüência nos conduzirá à Redenção. Mas, embora tenhamos de derivar do Novo Testamento muitos testemunhos, outros também da lei e dos profetas, onde se faz expressa menção de Cristo, contudo todos tendem a este fim: que Deus, o Artífice do universo, se nos patenteia na Escritura; e o que dele se deva pensar, nela se expõe, para que não busquemos por veredas ambíguas alguma deidade incerta.
. A BÍBLIA, A PALAVRA DE DEUS ESCRITA
Contudo, seja porque Deus se fez conhecido aos patriarcas através de oráculos e visões, seja porque, mediante a obra e ministério de homens, ele deu a conhecer o que depois, pelas próprias mãos, houvessem de transmitir aos pósteros, porém está fora de dúvida que a firme certeza da doutrina foi gravada em seu coração, de sorte que fossem persuadidos e compreendessem que o que haviam aprendido procedera de Deus. Pois, através de sua Palavra, Deus fez para sempre com que a fé não fosse dúbia, fé esta que houvesse de ser superior a toda mera opinião. Por fim, para que em perpétua continuidade de doutrina, a sobreviver por todos os séculos, a verdade per- manecesse no mundo, esses mesmos oráculos que depositara com os patriarcas ele quis que fossem registrados como que em instrumentos públicos. Neste propósito, a lei foi promulgada, a qual mais tarde os profetas foram acrescentados como intérpretes.Ora, visto que o uso da lei foi múltiplo, como se verá melhor no devido lugar, na verdade foi especialmente outorgada a Moisés e a todos os profetas a incumbência de ensinar o modo de reconciliação entre Deus e os homens, donde também Paulo chama Cristo o fim da lei (Rm 10.4). Contudo, outra vez o reitero, além da doutrina apropriada da fé e do arrependimento, que apresenta Cristo como o Mediador, a Escritura adorna de marcas e sinais inconfundíveis ao Deus único e verdadeiro, porquanto criou o mundo e o governa, para que ele não se misture com a espúria multidão de divindades.
Portanto, por mais que ao homem, com sério propósito, convenha volver os olhos a considerar as obras de Deus, uma vez que foi colocado neste esplendíssimo teatro para que fosse seu espectador, todavia, para que fruísse maior proveito, convém-lhe, sobretudo, inclinar os ouvidos à Palavra. E por isso não é de admirar que, mais e mais, em sua insensibilidade se façam empedernidos aqueles que nasceram nas trevas, por- quanto pouquíssimos se curvam dóceis à Palavra de Deus, de sorte que se contenham dentro de seus limites; ao contrário, antes exultam em sua futilidade.
Mas, para que nos reluza a verdadeira religião, é preciso considerar isto: que ela tenha a doutrina celeste como seu ponto de partida; nem pode alguém provar sequer o mais leve gosto da reta e sã doutrina, a não ser aquele que se faz discípulo da Escritura. Donde também provém o princípio do verdadeiro entendimento: quando abraçamos reverentemente o que Deus quis testificar nela acerca de si mesmo. Ora, não só a fé consumada, ou completada em todos os seus aspectos, mas ainda todo reto conhecimento de Deus nascem da obediência à Palavra. E, fora de toda dúvida, neste aspecto, com singular providência, Deus em todos os tempos teve em conside- ração os mortais.
A BÍBLIA É O ÚNICO ESCUDO A PROTEGER DO ERRO
Com efeito, se refletirmos bem quão acentuada é a tendência da mente humana para com o esquecimento de Deus; quão grande sua inclinação para com toda sorte de erro; quão pronunciado o gosto de a cada instante forjar novas e fantasiosas religiões, poder-se-á perceber quão necessária foi tal autenticação escrita da doutri-na celestial, para que não desvanecesse pelo ouvido, ou se dissipasse pelo erro, ou fosse corrompida pela petulância dos homens.Como sobejamente assim se evidencia, Deus proveu o subsídio da Palavra a todos aqueles a quem quis, a qualquer tempo, instruir eficientemente, porque ante- via ser pouco eficaz sua efígie impressa na formosíssima estrutura do universo. Portanto, necessário se nos faz trilhar por esta reta vereda, caso aspiremos, com seriedade, à genuína contemplação de Deus.Afirmo que importa achegar-se à Palavra onde, de modo real e ao vivo, Deus nos é descrito em função de suas obras, enquanto essas próprias obras aí se apre- ciam, não conforme a depravação de nosso julgar, mas segundo a norma da verdade eterna. Se dela nos desviamos, como há pouco frisei, ainda que nos esforcemos com extrema celeridade, entretanto, uma vez que a corrida será fora da pista, jamais conseguirá ela atingir a meta. Pois assim se deve pensar: o resplendor da face divi- na, o qual o Apóstolo proclama ser inacessível [1Tm 6.16], nos é inextricável labi- rinto, a não ser que pelo Senhor sejamos dirigidos através dele pelo fio da Palavra, visto ser preferível claudicar ao longo desta vereda a correr a toda brida fora dela.
Assim é que, não poucas vezes [Sl 93, 96, 97, 99 e afins], ensinando que impor-ta alijar do mundo as superstições para que floresça a religião pura, Davi representa Deus a reinar, significando pelo termo reinar não o poder do qual Deus se acha investido e o qual exerce no governo universal da natureza, mas a doutrina pela qual para si reivindica soberania legítima, porquanto os erros jamais podem ser arranca- dos do coração humano, enquanto não for nele implantado o verdadeiro conheci- mento de Deus.
. A SUPERIORIDADE REVELACIONAL DA BÍBLIA SOBRE A CRIAÇÃO
Por isso, o mesmo Profeta, onde trouxe à lembrança que a glória de Deus é proclamada pelos céus, que as obras de suas mãos são anunciadas pelo firmamento, que sua majestade é apregoada pela seqüência regular dos dias e das noites [Sl 19.1,2], em seguida desce à menção da Palavra: “A lei do Senhor” diz ele, “é sem defeito,reanimando as almas; o testemunho do Senhor é fiel, dando sabedoria aos pequeni- nos; os atos de justiça do Senhor são retos, alegrando os corações; o preceito do Senhor é límpido, iluminando os olhos” [Sl 19.7, 8].
Ora, embora ele inclua ainda outros usos da lei, contudo assinala, de modo geral, porquanto em vão Deus convida a si a todos os povos pela contemplação do céu e da terra, afirmando que esta é a escola especial dos filhos de Deus: a Escritura.Idêntica é a perspectiva do Salmo 29, no qual o Profeta, após discursar a respei-to da voz terrível de Deus, a qual sacode a terra com trovões, ventanias, chuvas, furacões e tempestades, faz tremer as montanhas, despedaça os cedros, contudo no final acrescenta que seus louvores são entoados no santuário, porquanto os incrédu- los são surdos a todas as vozes de Deus que ressoam nos ares. De igual modo, assim ele conclui em outro dos Salmos, onde descreveu as ondas espantosas do mar: “Mui fiéis são teus testemunhos; a santidade convém a tua casa, para sempre” [Sl 93.5] Daqui também promana aquilo que Cristo dizia à mulher samaritana [Jo 4.22]: que seu povo e todos os demais povos adoravam o que desconheciam; e que somente os judeus exibiam o culto verdadeiro de Deus.
Ora, já que, em razão de sua obtusidade, de modo algum a mente humana pode chegar a Deus, salvo se for assistida e sustentada por sua Santa Palavra, então todos os mortais – excetuados os judeus –, visto que buscavam a Deus sem a Palavra, lhes
foi inevitável que vagassem na futilidade e no erro.
SOLA DEO GLÓRIAS.
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Parabéns irmão pela iniciativa de popularizar e divulgar os escritos de Calvino! Deus continue abeçoando sempre. Abraço da Equipe dos Plugados com Deus.
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